A Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) domina a técnica de tratamento da água do mar, mas, por enquanto, não pretende usá-la. Nem mesmo agora, na crise hídrica causada pela estiagem que assola o estado há dois anos, em especial Curitiba e Região Metropolitana, onde há racionamento de água desde março de 2020. A explicação para a tecnologia não ser utilizada é o alto custo da operação e o impacto ambiental do processo.
Segundo a Sanepar, a dessalinização é uma das operações de captação de água mais caras do mundo. O valor é quase cinco vezes maior do que o da captação normal em barragens e rios – isso sem contar o valor de obra para construção de dutos e estações de dessalinização. Portanto, o uso da tecnologia teria impacto direto na tarifa paga pelo consumidor, o que inviabiliza a operação. “As fontes atuais de captação da Sanepar são mais viáveis economicamente”, enfatiza a companhia.
Além disso, o sal separado da água poderia representar um risco ambiental. Esse resíduo precisaria ser compactuado e descartado de maneira especial para não impactar no meio ambiente. Esse processo elevaria ainda mais o tratamento da água marinha. “Embora tenha sido bem-sucedido na remoção de sais e meais presentes na água e a tecnologia seja hoje de domínio da companhia, o uso dessa solução é inviável do ponto de vista econômico”, reforça a Sanepar.
A estatal de saneamento iniciou em 2013 estudos do tratamento da água do mar em parceria com pesquisadores da Universidade de Londres, na Inglaterra, da Universidade do Norte do Texas, nos Estados Unidos, e da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Em julho de 2016 foi instalada um sistema de dessalinização na estação de tratamento de água da Sanepar em Pontal do Paraná, no Litoral.
Com capacidade de produzir mil litros de água tratada por hora, o sistema de separação do sal e da água em Pontal de Paraná deixou de operar em 2018, após a companhia verificar que o custo não era viável. O equipamento usava a tecnologia de osmose reversa, em que membranas semipermeáveis filtram os sais impróprios, transformando a água própria para consumo.
O custo ficaria ainda mais inviável para utilizar essa água do mar tratada no abastecimento de Curitiba e Região Metropolitana, onde o rodízio mais severo de 36 horas de abastecimento por 36 horas sem água passou a valer novamente em 11 de agosto, quando a capacidade dos reservatórios voltaram a ficar abaixo de 50%. Segundo a Sanepar, o custo de infraestrutura para construção de dutos, bombeamento e distribuição, tendo de atravessar toda a Serra do Mar, não vale a pena.
“Tratam-se de distâncias da ordem de 100 quilômetros e alturas de quase 1.000 metros que precisam ser vencidas. Ou seja, condições nada usuais para qualquer sistema de abastecimento de água do mundo”, explica a companhia de Saneamento.
Dessalinização no Brasil
No Brasil, o uso de água dessalinizada para consumo se restringe ao Nordeste. Um dos programas é do Ministério do Desenvolvimento Regional na região do semiárido, que mesmo distante do mar tem água salobra. O programa, chamado Água Dose, instalou entre 2019 e 2020 um total de 265 estações de tratamento em seis estados: Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte, Piauí, Bahia e Alagoas.
Um dos sistemas de tratamento de água do mar mais antigos no país é no arquipélago de Fernando de Noronha, onde aproximadamente 60% do abastecimento é de água dessalinizada. Lá, a captação local de água doce não atende a demanda e a construção de dutos para levar água potável do continente às ilhas é ainda mais inviável. Por isso a dessalinização se tornou uma alternativa de abastecimento menos dispendiosa.
Em fevereiro, o governo de Pernambuco anunciou investimento de R$ 22 milhões na atualização do sistema de dessalinização da água em Fernando de Noronha a partir da tecnologia por osmose inversa, a mesma testada pela Sanepar. O novo sistema vai aumentar em praticamente cinco vezes o fornecimento de água em Fernando de Noronha, com a produção passando de 15 metros cúbicos por hora para 72.
Outras tecnologias da Sanepar
O tratamento de água do mar é uma dos sistemas alternativos de captação testados pela Sanepar mesmo antes mesmo da atual crise hídrica. No começo do ano, por exemplo, a companhia passou a testar um sistema chamado semeadura de nuvens, em que um avião “faz chover”.
A partir de um reservatório de 300 litros de água potável acoplado em um avião, o sistema injeta microgotículas de água potável em nuvens já carregadas para induzir a chuva em pontos estratégicos: as proximidades das represas. Essas gotículas carregam ainda mais a nuvem, forçando a chuva a partir do próprio peso da água. ”