O grande volume de pacientes com sequelas da Covid-19 vem exigindo do sistema de saúde no Paraná um replanejamento. Algumas prefeituras e os próprios hospitais estão montando estratégias para que o atendimento desses pacientes não lotem ainda mais os ambulatórios do SUS, que já eram sobrecarregados antes mesmo da pandemia e ainda terão de absorver todas as consultas e procedimentos impedidos de ser feitos durante a crise sanitária.
Além da parte de gestão, o objetivo é que o paciente seja atendido por equipes de saúde multidisciplinares, que avaliem e tratem todos os sintomas persistentes deixados pela Covid-19, acelerando a reinserção da pessoa às suas atividades econômicas, familiares e sociais.
Em 2021 a Organização Mundial de Saúde (OMS) taxou essas sequelas como uma doença propriamente dita, a síndrome pós-Covid-19. Entre os sintomas persistentes do paciente já curado da Covid-19 pode haver problemas cardíacos, dificuldades respiratórias, impactos neurológicos, falta de paladar, dificuldades motoras, queda de cabelo, depressão, crises renais, entre outros. A estimativa da OMS é de que esses problemas atinjam 10% dos curados da Covid-19, incluindo quem teve infecção leve ou mesmo assintomática. Dessa maneira, conforme o número de casos atual, cerca de 141 mil pessoas no Paraná podem ter sequelas e precisar de atendimento médico após se livrarem do coronavírus.
Em Curitiba, a prefeitura reforçou o acolhimento de pacientes sequelados contratando atendimento exclusivo em três complexos de saúde: o Hospital de Clínicas (HC), o Hospital de Reabilitação e o Hospital Cajuru. Há também ofertas de atendimento em clínicas de fisioterapia. “Essas ofertas de serviços para pessoas com sequelas da Covid-19 têm portas de entrada própria, eles não entram na fila geral”, reforça a prefeitura da capital sobre o planejamento para não inchar ainda mais a fila nos consultórios de especialidades.
A prefeitura de Maringá, por sua vez, encaminha há dois meses os pacientes sequelados para atendimento nas três maiores universidades da cidade. Além de médicos de 16 especialidades, a parceria com a Universidade Estadual de Maringá (UEM), Uningá e Unicesumar presta atendimento em áreas como psicologia, fisioterapia, nutrição, odontologia, fonoaudiologia, entre outras. “As universidades conseguem dar a estrutura que o municípios não tem, como piscinas aquecidas para fisioterapia”, ilustra o secretário de saúde de Maringá, Marcelo Puzzi.
O sistema é integrado entre as universidades e o SUS
municipal, permitindo que todos os profissionais tenham acesso ao prontuário do
paciente.
Em julho, foram atendidos 138 pacientes que saíram direto do hospital para as clinicas de reabilitação das universidades de Maringá. Em agosto, os pacientes passaram de 200. E a tendência é a demanda continuar aumentando, já que a pandemia ainda não acabou e pode haver uma demanda reprimida de pacientes nos quais os sintomas das sequelas ainda não apareceram.
De acordo com Puzzi, tirar o paciente sequelado da fila ambulatorial é o melhor a ser feito em termos de gestão. Sem um atendimento coordenado, aponta o secretário de Saúde de Maringá, esse paciente ficaria circulando por médicos de diversas áreas no SUS, que tratariam apenas um sintoma específico. “Sem esse atendimento coordenado o paciente sequelado teria um atendimento ainda mais lento, teria mais dificuldade de obter resultados dentro da agilidade que esse tratamento requer”, justifica o secretário.
“A rede SUS já era sobrecarregada antes da pandemia e vai
receber uma nova carga agora com as consultas e procedimentos de outras doenças
que não puderam ser feitos na pandemia. Então a gente teve que montar essa nova
estratégia para que esses pacientes sequelados não confluíssem com as demandas
que já existem”, reforça Puzzi.
A Gazeta do Povo solicitou à Secretaria Estadual de Saúde (Sesa) informações da estratégia do governo do Paraná para atender o impacto da entrada dos sequelados da Covid no SUS. A assessoria de imprensa da Sesa respondeu que iria agendar entrevista com o secretário Beto Preto, o que não aconteceu até fechamento desta reportagem.
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Importância do diagnóstico
A Santa Casa de Curitiba é um dos hospitais que vai implantar um departamento exclusivo para coordenar o tratamento de pacientes com sequelas da Covid-19. Inicialmente, o serviço começará com aproximadamente 500 atendimentos por mês.
O Centro Multidisciplinar de Reabilitação Pós-Covid da Santa Casa será atendido por 12 especialidades médicas e mais as equipes de enfermagem, fisioterapia, fonoaudiologia, assistência social e outros profissionais. Porém, ressalta o diretor técnico da Santa Casa, o médico Altemar Paigel, todas as 30 especialidades do hospital poderão ser acionadas se houver necessidade no tratamento.
Paigel explica que esse tratamento multidisciplinar das sequelas da Covid-19 é fundamental, com uma triagem de diversas especialidades. “Esses sequelas ainda são muito subdiagnosticadas porque são vários sintomas que muitas vezes o paciente não consegue perceber que têm relação com a Covid-19 e que se não forem tratados podem se agravar”, reforça o médico. “Muitas vezes o paciente nota e vai procurar tratamento para uma falta de ar, por exemplo, mas não percebe ou não relaciona que a queda de cabelo que está tendo também é uma sequela da Covid”, reforça o diretor-técnico da Santa Casa.
Paigel acredita que não só a rede pública, mas também a rede privada, deva adotar esse tratamento multidisciplinar para que o paciente possa voltar a ter uma vida normal o mais rápido possível, reduzindo inclusive impactos econômicos na sociedade. “Essas pessoas com sequelas da Covid se não forem tratadas adequadamente, com uma visão holística, de todas as necessidades de atendimento, além de ficar batendo e voltando nos ambulatórios de especialidades, vão levar mais tempo para renderem no seu trabalho, nas interações familiares e círculos de amizades. Ou seja, vão demorar para serem reintegradas na sociedade”, aponta o diretor-técnico da Santa Casa de Curitiba.