Documento assinado por TJ, MP, OAB, DPPR e UFPR foi entregue ao governador Ratinho Junior (PSD) nesta segunda-feira (25). Ideia, de acordo com estudo, é ‘diminuir letalidade da polícia’.
O governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), recebeu nesta segunda-feira (25) um ofício sugerindo a adoção de câmeras nos uniformes e viaturas dos policiais militares, além da criação de um curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos para a formação de policiais.
O documento foi elaborado e entregue por representantes de instituições do Sistema de Justiça e da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que argumentam que a implantação das câmeras é uma forma de reduzir a “letalidade da polícia”.
Em 2021, conforme a Polícia Militar (PM), 406 civis foram mortos pela polícia. No primeiro trimestre deste ano, foram 123.
“Seu uso [de câmera] tem sido correlacionado à existência de maior transparência, legitimidade, validade probatória e, no que aqui importa, diminuição da intensidade do nível de uso da força”, sustentam os autores.
De acordo com o governo estadual, está em andamento um projeto piloto para utilização de “Body Cam” ( câmera corporal acoplada à farda) por profissionais da segurança pública.
Em nota encaminhada à RPC, o governo afirmou que uma comissão da Polícia Militar verifica o modelo utilizado por outros estados e avalia a compra de 500 equipamentos. O custo estimado é de R$ 21 milhões.
O encontro foi fechado, mas a RPC teve acesso ao documento entregue ao governador e aos estudos que embasaram as sugestões.
Violência policial
No estudo, o MP considera dados da Polícia Militar e analisa a relação entre os 380 civis e os dois policiais mortos em confrontos em 2020. A proporção de 190 civis mortos para cada agente policial morto ficou acima e distante da média nacional de 33 civis mortos para cada policial morto.
“Vale ressaltar que não são poucos os estudos que sugerem que a agência policial estaria usando a força letal de maneira desproporcional à ameaça sempre que aferida uma proporção de mais de 10 civis mortos em relação ao número de policiais mortos”, aponta o estudo.Média por mês de civis mortos em confrontos com policiais militares no ParanáMédia de mortes por mês.
Câmeras
O documento sugere que seja elaborado e executado progressivamente um programa que torne obrigatório o uso de câmeras com gravação de vídeo e áudio nas viaturas e fardas dos policiais, além de instrumento de geolocalização.
Pela proposta, os arquivos dessas gravações devem ser armazenados em formato digital.
O estudo do MP cita um relatório do Ministério da Justiça e Segurança Pública que analisou experiências no Brasil e no exterior e concluiu que o uso de câmeras em agentes policiais:
- reduz os índices criminais;
- diminui o número de queixas contra policiais;
- reduz o uso da força nas ocorrências policiais;
- produz imagens melhores em relação a câmeras fixas;
- tem “efeito pacificador” das relações sociais, induzindo policial e cidadão a se comportarem de forma mais branda;
- não reduz a proatividade dos policiais.
O documento cita ainda que o uso de câmeras poderia, inclusive, desincentivar denúncias infundadas contra policiais, “as quais passam a ser facilmente refutadas”.
Exemplos
O uso de câmeras corporais é adotado em quatro estados brasileiros: São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Rondônia.
O caso de Santa Catarina, estado vizinho ao Paraná, foi estudado por pesquisadores das universidades de Warwick, Queen Mary e da London School of Economics, no Reino Unido, e da PUC-Rio.
A conclusão foi de que houve queda de até 61,2% no uso de força pelos agentes de segurança, incluindo uso de força física, armas letais e não letais, algemas e realização de prisões em ocorrências com a presença de civis.
Já em São Paulo, uma análise dos primeiros quatro meses de uso de câmeras mostrou queda de 46% do número de mortes decorrentes da atividade policial.
Curso de direitos humanos
A segunda sugestão apresentada ao governador Ratinho Junior é a estruturação de um curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos para todo o Sistema de Justiça e autoridades policiais.
O texto cita pesquisa que apontou que o Brasil está envolvido em mais de 60 processos na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), e que parte substancial desses processos está ligada ao tema da letalidade policial.
O estudo do MP cita trecho de um relatório da Comissão que fala sobre violações de direitos humanos por agentes policiais no Brasil:
“A CIDH enfatiza que essas violações tendem a se dar em desfavor de grupos específicos, como pessoas afrodescendentes e pessoas em situação de pobreza e pobreza extrema”.
De acordo com o MP, essa situação relatada pela CIDH é “facilmente constatável na realidade do Estado do Paraná”.
“Com efeito, conforme as informações compiladas pela Coordenação do GAECO/MPPR, dos 210 civis mortos no primeiro semestre de 2021, mais de 50% eram pessoas negras ou pardas. (…) Estes dados são expressivos, especialmente, por força da configuração demográfica do Paraná, onde a soma da população negra e parda representa apenas cerca de 30% da população paranaense”, aponta.
Fonte: RPC