A exposição excessiva às telas traz consequências para a cognição, emoções, linguagem, comunicação e sociabilização, alerta especialista do Pequeno Príncipe.
O uso de telas por crianças e adolescentes é um tema que há tempos preocupa especialistas e muitos pais. Com a pandemia, a adoção de aulas on-line intensificou essa preocupação sobre os riscos e a necessidade de definir limites para a exposição de crianças e adolescentes à internet, redes sociais, aplicativos e dispositivos como celulares, desktops e videogames – as chamadas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs).
O neuropediatra do Hospital Pequeno Príncipe Antônio Carlos de Farias (CRM Paraná 12007) explica que as TICs são estímulos ambientais que interferem no desenvolvimento cerebral e mudam a forma de pensar, memorizar e fazer uma atividade. O uso das tecnologias tem efeitos, portanto, na cognição, emoções, linguagem, comunicação e socialização.
Entre os principais riscos do uso abusivo dos eletrônicos apontados pelo especialista estão distúrbios como a dependência, irritabilidade, ansiedade, depressão, transtorno alimentar e do ciclo de sono, obesidade, transtorno de imagem corporal, comportamentos autolesivos e abuso de substâncias, como bebidas alcoólicas, nicotina e outras drogas.
Primeira infância e adolescência
Para as crianças abaixo de 2 anos, a orientação da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) é de tempo zero de telas. Os especialistas explicam que a exposição às telas nessa faixa etária afeta o neurodesenvolvimento e altera os ritmos adequados de alimentação, sono, carinho, afeto e experiências sensoriais.
As crianças pequenas se desenvolvem e aprendem pela observação e imitação de expressões verbais e não verbais, linguagem, movimentos e sentimentos das pessoas com as quais elas interagem. Quando esses estímulos são reduzidos pelo uso de telas, ocorrem prejuízos não só para a inteligência, a comunicação e as habilidades motoras, mas também para as relações afetivas, a empatia e o controle emocional.
Os bebês muito expostos ao mundo virtual sem o contraponto concreto possuem grande incidência de atraso de linguagem e distúrbio do ciclo do sono. “É mito pensar que oferecer tecnologia a um bebê aumenta suas habilidades cerebrais e QI. Estes atributos dependem do lúdico e da experiência concreta”, enfatiza Antônio Carlos.
Os efeitos da privação de sensações motoras e socioafetivas causados pelo excesso no uso de tecnologias foram tema de pesquisa do romeno Marius Teodor Zamfir com crianças de 0 a 3 anos, publicada em 2018. O resultado indicou que o consumo de mais de quatro horas por dia de ambiente virtual pode ativar comportamentos e elementos semelhantes aos encontrados em crianças com diagnóstico de Transtorno de Espectro Autista (TEA). O estudo chamou essa forma de “autismo visual”.
Na adolescência, o uso abusivo das tecnologias interfere na atenção, memória operacional, habilidade reflexiva, julgamento, resolução de problemas e tomada de decisão. É na fase da adolescência que fica mais aparente o descompasso entre o amadurecimento cerebral e as estruturas que modulam as emoções. O resultado são comportamentos como a impulsividade, pouca tolerância à frustração, baixa noção de causa e efeito e agressividade.
Limites
Para orientar famílias, educadores e pediatras sobre o uso das TICs e o seu impacto na saúde e no comportamento das crianças e adolescentes, a Sociedade Brasileira de Pediatria publicou, em 2019, o Manual de Orientação #Menos Telas #Mais Saúde. Conheça dez dessas recomendações que indicam limites para o uso de telas:
- Menores de 2 anos: evitar a exposição às telas, inclusive passivamente.
- Entre 2 e 5 anos: máximo de 1 hora por dia, sempre com a supervisão de pais e responsáveis.
- Entre 6 e 10 anos: máximo de 1 a 2 horas por dia, sempre com supervisão de pais e responsáveis.
- Entre 11 e 18 anos: máximo de 2 a 3 horas por dia para telas e jogos de videogame, e nunca permitir “virar a noite” jogando.
- Estimular o uso das tecnologias em locais comuns da casa e não de forma isolada nos quartos.
- Para todas as idades: nada de telas durante as refeições e se desconectar 1 a 2 horas antes de dormir.
- Oferecer atividades esportivas, exercícios ao ar livre ou em contato direto com a natureza, sempre com supervisão dos responsáveis.
- Nunca postar fotos de crianças e adolescentes em redes sociais públicas.
- Criar regras saudáveis para o uso dos equipamentos e aplicativos digitais e aplicar senhas e filtros apropriados.
- Evitar encontros com desconhecidos on-line ou off-line; saber o que estão jogando e sobre conteúdos de risco.
Quando o assunto é o uso adequado das tecnologias, a família tem uma responsabilidade central. O neuropediatra do Pequeno Príncipe expõe fatores que podem motivar as crianças e os adolescentes a utilizarem a internet e redes sociais como válvula de escape: omissão de autoridade, abandono e distanciamento. “Pais que não desgrudam do celular não percebem as vulnerabilidades que estão gerando na proteção dos seus filhos”, alerta.