A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (9) o texto-base do projeto que aumenta o poder do Ministério da Agricultura para o registro de novos agrotóxicos e esvazia atribuições de Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e Ibama na decisão envolvendo pesticidas.
O texto-base foi aprovado por 301 a 150. Agora, os deputados vão analisar sugestões de modificações ao projeto, que, a seguir, retorna ao Senado.
O texto, apresentado pelo Senado em 2002, é criticado por ambientalistas por, na avaliação deles, permitir o registro de agrotóxicos que seriam comprovadamente nocivos e cancerígenos. Eles afirmam que o projeto retira amarras que constam na atual legislação sobre o tema.
Apoiado pela bancada ruralista, o projeto torna o Ministério da Agricultura responsável pelo registro de agrotóxicos e também por analisar propostas de edição e alteração de atos normativos sobre o tema. Além disso, a pasta faria a autorização e emissão do registro temporário.
Hoje a decisão de registro de agrotóxicos cabe ao Ministério da Agricultura, ao Ibama e à Anvisa. Os dois últimos virariam apenas órgãos que avaliariam ou homologariam as análises.
O projeto em tramitação na Câmara cria o registro temporário para produtos novos destinados a pesquisas e experimentações, que deverá ter análise concluída em até 30 dias.
O texto proíbe registro de pesticidas e de produtos de controle ambiental que, nas condições recomendadas de uso, apresentem risco inaceitável para humanos ou para o meio ambiente.
Segundo o projeto, quando organizações internacionais responsáveis pela saúde, alimentação ou meio ambiente das quais o Brasil faça parte alertarem para riscos ou desaconselharem o uso de pesticida, o Ministério da Agricultura poderá instaurar procedimento para reanálise do produto.
O Ministério da Agricultura, a União e os estados deverão definir critérios, valores e aplicar multas de R$ 2.000 a R$ 2 milhões, proporcionalmente à gravidade da infração no caso de danos à saúde ou ações administrativas.
Na Câmara, comissão especial responsável por analisar o texto aprovou em junho de 2018 um substitutivo do deputado Luiz Nishimori (PL-PR), também escolhido para relatar o projeto no plenário.
No parecer, ele afirmou que foram identificados “inúmeros problemas que dificultam a disponibilidade de pesticidas seguros aos agricultores para o manejo ou controle de pragas e doenças, conforme verificado a seguir, sem querer esgotar todas as situações.”
A seguir, cita alguns entraves, como o fato de, segundo ele, a atual legislação não considerar as características e dificuldades de produzir na região tropical.
Além disso, indicou no relatório, a avaliação “dos pesticidas e afins está desatualizada em relação ao cenário internacional, pois usa parâmetros em desacordo com as recomendações de tratados e acordo internacionais assinados pelo País, que são posteriores a atual Lei 7.802/1989.”
Nishimori também critica o fato de o Brasil ainda realizar suas análises em função do perigo do produto, e disse que o “sistema de registro de pesticidas é extremamente burocrático, em que se perpetuou longas filas nos órgãos federais de análise.”
Ele também contesta o uso do termo agrotóxico, que, afirmou, é depreciativo e só é utilizado no Brasil. “Dessa forma, para colocar uma pá-de-cal nas inúmeras discussões sobre a terminologia, há necessidade de adotar nomenclatura internacional: pesticidas.”
“A afirmação de que esse projeto vai colocar mais veneno na mesa dos brasileiros é mentira. Quem fala isso não tem fundamento. Esse é um discurso meramente de posição ideológica e política. Dizer que esse projeto ataca a legislação ambiental é mentira. Quem fala isso também não se sustenta”, acrescentou Nishimori.
No plenário, Nishimori acatou uma emenda que diz que produtos fitossanitários para uso próprio são isentos de registro desde que não haja comercialização ou não utilize agente de controle biológico exótico ou sem ocorrência no Brasil, entre outras condições.
A tramitação do projeto foi acelerada. A urgência foi aprovada na tarde desta quarta, como parte de acordo entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e a oposição no final do ano passado.
Ambientalistas criticam o projeto e veem retrocesso na ampliação do poder do Ministério da Agricultura no registro dos agrotóxicos. Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, aponta retrocessos no projeto.
“Eles somem com vedações expressas a produtos que causam câncer. Isso some. Eles simplificam e substituem por uma coisa mais genérica, falando que vão fazer análise de risco. Me preocupa bastante, mas você acaba dando um cheque em branco e não sabe exatamente o que vai ocorrer.”
No plenário, o deputado Domingos Sávio (PSDB-MG) chamou a campanha contrária ao texto de covarde ao buscar qualificar os deputados favoráveis de “deputados do câncer”.
“Hoje, demora-se até 10 anos para analisar a possível aprovação de uma molécula. O projeto que nós estamos querendo discutir diz que não se pode aprovar nenhum novo produto que seja mais tóxico do que o que está no mercado”, afirmou.
“O mercado está ficando cartelizado, na mão de uns poucos, o preço do defensivo agrícola indo lá nas alturas, sacrificando o produtor, inclusive aquele da agricultura familiar.”
Em nota, a Frente Parlamentar Ambientalista lembrou que tramita na Câmara um projeto que busca reduzir gradual e progressivamente o uso de agrotóxicos na produção agropecuária.
“A sociedade precisa de medidas de proteção à saúde, e que a própria legislação e a regulação de agrotóxicos assegurem maior proteção aos biomas, ecossistemas, bens da natureza, a vida das pessoas e dos animais”, indica.
“Afora isto, as medidas que carecem de maior urgência, neste momento, devem mirar conter os impactos sociais e econômicos que a pandemia de Covid-19 tem causado.”
O deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) também lamentou a aprovação. “Não dá para nós colocarmos na mesa do brasileiro cada vez mais veneno. O atual governo registrou 1.500 moléculas nesses três anos, 1.500 moléculas de agrotóxicos, muitos deles banidos em diversos países”, afirmou.
“Nós temos que trabalhar em uma outra perspectiva de incentivar a produção orgânica, a produção mais limpa, a produção sustentável e saudável.”
Fonte: Agência Brasil