Troca de cartas públicas na França é sintoma da aceleração de tensões para as eleições do país previstas para 2022
Artigo publicado originalmente no portal do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (Gedes)
*por Carolina Antunes Condé de Lima, doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP)
No dia 21 de abril, vinte e cinco generais da reserva francesa publicaram uma carta, assinada por outros mil militares, alertando o presidente Emmanuel Macron sobre a possibilidade e o limiar de uma guerra civil estourar na França.
De acordo com os generais, as políticas frouxas de segurança pública do atual governo resultariam em caos, gerando a necessidade de intervenção dos militares na ativa, a fim de proteger aquilo que chamaram de “valores civilizacionais franceses”.
Em sua carta, os generais apontam para o perigo da desintegração da integridade e da identidade francesas, e os culpados por isso seriam os antirracistas, pessoas não brancas e, particularmente, o islã.
A carta deslegitima os muçulmanos como cidadãos legítimos ou residentes da França e os trata como uma horda de estrangeiros cujas ideologias e práticas ameaçam a identidade natural do país.
No texto, os generais ainda afirmam que áreas ao redor de algumas cidades francesas foram transformadas em territórios sem lei pelos seus habitantes não-brancos, abalando as estruturas da república da França. No fim, para eles, a simples existência de minorias é uma ameaça à nação.
Como resposta, o governo e partidos de esquerda se manifestaram contra a carta, uma vez que o documento fere a ideia de controle civil sobre os militares, esperado em governos democráticos. A Ministra da Defesa, Florence Parly, falou em punir os signatários que ainda estão na ativa por descumprirem a lei que requer que militares sejam politicamente neutros.
Uma semana após a carta, o chefe do Estado-Maior, general François Lecointre, afirmou que os militares na ativa que assinaram a carta irão passar por um tribunal militar e receberão sanções.
O assunto, que parecia resolvido, voltou às manchetes no dia 9 de maio, quando uma nova carta, dessa vez atribuída a militares franceses na ativa, veio a público, apontando para o que chamam de “concessões ao islamismo” feitas pelo governo de Macron, reforçando o alerta de uma guerra civil.
A nova manifestação é feita por homens e mulheres que dizem terem dado suas vidas em combate ao islamismo em intervenções mundo afora e agora assistem a concessões sendo feitas no próprio país.
Manifestações como essa não são novidade na França. A publicação da primeira carta aconteceu na data na qual se relembra a tentativa de golpe sofrida pelo então presidente Charles de Gaulle, conhecida como putsch de Argel, há 70 anos.
Fonte: https://areferencia.com/europa