Na mensagem enviada à Assembleia Legislativa em que propõe reajustar em 3% o salário dos servidores estaduais, o governador Ratinho Jr. (PSD) tenta convencer os deputados e a sociedade de que a revisão salarial proposta já é fruto de muito esforço orçamentário e que não há espaço para que se negocie um valor maior.
“Cumpre indicar que este percentual já foi estimado levando-se em conta o cancelamento de dotações apresentadas no Projeto de Lei Orçamentária Anual para o Exercício de 2022 (Lei n°533/221), não havendo, desta forma, espaços orçamentários para concessão em percentual maior, no presente exercício orçamentário”, diz a justificativa do projeto de lei.
Seria mais justo o governador dizer que, na verdade, sua gestão tem outras prioridades que não o reajuste ao funcionalismo, porque tem, sim, de onde tirar o dinheiro.
A primeira e mais evidente ação seria reduzir os benefícios fiscais dados a empresários do estado. Concedidos dentro da lógica de um capitalismo de gabinete, em que diferentes setores buscam relações e argumentos que os façam pagar menos impostos, os benefícios carecem de critérios, de justificativas, de transparência e de escrutínio de seus resultados. Para 2022, o governo Ratinho Jr. elevou as renúncias fiscais a patamares inéditos – ao menos desde 2017, quando os dados passaram a ser divulgados.
Em 2021, o valor das isenções foi de R$ 12,4 bilhões. A previsão para 2022 é de um aumento de 40%, o que levará o estado a abrir mão de R$ 17,4 bilhões de receita. Isso equivale a 31% do orçamento do Paraná para o ano que vem.
Vamos gastar mais um pouco a matemática. Ontem (29), da tribuna da Assembleia, o líder do governo, Hussein Bakri (PSD), afirmou que cada ponto percentual de aumento aos servidores equivale a um aumento de R$ 400 milhões anuais na despesa. Portanto, se o estado optasse por manter os benefícios a empresários no mesmo patamar de 2021, poderia ter incremento de receita de R$ 5 bilhões. Com isso – no limite desse exercício quase anedótico – já caberiam mais 12,5 pontos porcentuais de reajuste.
Mas tem onde conseguir ainda mais um pontinho para os servidores. Há um bom tempo, o governo debate internamente a retirada do Fundo de Participação dos Estados do cálculo do repasse de dinheiro aos poderes Legislativo e Judiciário. Em 2019, Ratinho Jr. até ensaiou uma LDO com essa nova regra, mas sucumbiu à pressão e manteve intacto o repasse a esses poderes, que são mais perdulários que o Executivo. Se tivesse proposto essa retirada, o impacto seria uma economia de cerca de R$ 600 milhões ao governo do Paraná – mais 1,5 ponto para os servidores.
Todo esse dinheiro poderia ajudar a diminuir o abismo salarial que existe no serviço público paranaense. Enquanto os funcionários do governo têm média salarial de R$ 5 mil, os outros poderes têm, no mínimo, o dobro. Na Assembleia, R$ 10 mil; no Tribunal de Justiça, R$ 11 mil; no Ministério Público, R$ 18 mil; e no Tribunal de Contas, R$ 22 mil.
O motivo do esforço
Cobrar o reajuste devido pelo governo ao funcionalismo não é uma irresponsabilidade dos sindicatos. Antes de entrarmos nos motivos da reivindicação, é importante deixar claro quem são os servidores que estão sendo prejudicados pelas prioridades tortas do governo. Não estamos falando de marajás: são professores, policiais, enfermeiros, bombeiros e outras tantas carreiras que, na prática, prestam serviços fundamentais à população.
Essas carreiras enfrentam uma defasagem salarial que começou em 2016. Portanto, o governo já está devendo reajuste aos trabalhadores. E esse valor vai ficar ainda maior quando fecharmos a inflação de 2022 na casa dos 10%. Vamos, portanto, para o sexto ano em que o governo deixa os servidores com menos poder de compra.
Com exemplos as coisas funcionam melhor. Olhando para os menores salários do estado, como de funcionários de escola, o valor de 3% garante um reajuste de pouco mais de 40 reais ao mês. Com sorte, dá para sair do mercado com um pacote de 5kg de arroz e duas latas de óleo de soja.
Jornal Plural Curitiba Por João Frey